domingo, 19 de outubro de 2008

Barão recomenda:

http://semamorsoaloucura.blogspot.com/2006/09/dama-da-noite.html

"Dama da Noite" de Caio Fernando Abreu.

domingo, 12 de outubro de 2008

A arte de nos movermos cegos

Já há um tempo, assisti "Ensaio sobre a cegueira" dirigido pelo Fernando Meirelles baseado no livro de José Saramago. Fiquei impressionado com a riqueza de vida mostrada no filme, pois não foi nos detalhes escatológicos que prestei atenção, embora seja difícil não fazer isso, mas sim, na situação que os personagens vivenciaram a qual aparentemente parece ser impossível (todos ficarem cegos) e tentei enxergar o que tem de comum com aquilo que vivenciamos.
Não é necessário ir tão longe, quando nos encontramos em situação de desespero e desamparo (embora não exista exatamente palavra que una as duas coisas), tentamos ao máximo sobreviver, recorrer aos mais absurdos artifícios para mantermos boa saúde. Falo de boa saúde no sentido estritamente biológico em que precisamos responder às exigências fisiológicas como por exemplo, se alimentar, descansar, evacuar e até mesmo se movimentar. O movimento é uma exigência fisiológica: É preciso movimentar o estômago para que ele faça a digestão, movimentar os músculos da face para promover a mastigação. No entanto, existem coisas que escapam do movimento puramente fisiológico: A vida é uma delas.
É necessário nos movimentar para viver, do contrário estaria falando do sentido biológico. Por mais que sentimos fome, sede e outras necessidades internas, o nosso corpo não se contenta com esses simples movimentos. Ou melhor dizendo, a vida só é possível na medida que nos movimentamos. Desde os gestos mais simples como o de respirar até os malabarismos que damos em nós mesmos nos relacionamentos. Estamos nos movimentando o tempo todo: Vamos à uma ópera fazendo nossa membrana timpânica vibrar e nos fascinando com a suavidade de tons que cada melodia é colorida, nos sentimos tesos quando estamos diante de uma situação de perigo, contraindo então nossa musculatura. Falamos, mexemos a mandíbula, o lábio inferior, superior... pra ficarmos em alguns exemplos de que como o movimento é complexo, assim como a vida é.
No filme, os personagens caminham morinbundamente sem nome, sem uma suposta dignidade e ainda assim caminham, falam, sentem emoções, o coração ainda palpita e até mesmo os olhos que não vêem se mexem. É essa capacidade de movermos que nos coloca como sujeito em detrimento de um animal que se move por mover. Nós movemos, mesmo que ainda sem uma meta ou direção objetiva, para continuar vivendo: Movemos nossas idéias de lugar, elas tornam a ser outras, fazendo com que todo nosso pensamento mude e então nossas atitudes também mudem e assim vivemos: Nesse ato de mover-se que entre um passo e outro nos amamos, temos saudade, tenhamos ainda possibilidade de viver mesmo que estejamos cegos e com o ambiente insalubre, sem uma ordem moral das coisas.
É nesse "entreact" que vivemos.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

ESCUTATÓRIA

de Rubem Alves.


Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir. Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.
Escutar é complicado e sutil. Diz o Alberto Caeiro que "não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. É preciso também não ter filosofia nenhuma". Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas. Aí a gente que não é cego abre os olhos. Diante de nós, fora da cabeça, nos campos e matas, estão as árvores e as flores. Ver é colocar dentro da cabeça aquilo que existe fora. O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas. O que está fora não consegue entrar. A gente não é cego. As árvores e as flores entram. Mas - coitadinhas delas - entram e caem num mar de idéias. São misturadas nas palavras da filosofia que mora em nós. Perdem a sua simplicidade de existir. Ficam outras coisas. Então, o que vemos não são as árvores e as flores. Para se ver e preciso que a cabeça esteja vazia.
Faz muito tempo, nunca me esqueci. Eu ia de ônibus. Atrás, duas mulheres conversavam. Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos. (Contou-me uma amiga, nordestina, que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com as outras é comparar sofrimentos. Quanto maior o sofrimento, mais bonitas são a mulher e a sua vida. Conversar é a arte de produzir-se literariamente como mulher de sofrimentos. Acho que foi lá que a ópera foi inventada. A alma é uma literatura. É nisso que se baseia a psicanálise...) Voltando ao ônibus. Falavam de sofrimentos. Uma delas contava do marido hospitalizado, dos médicos, dos exames complicados, das injeções na veia - a enfermeira nunca acertava -, dos vômitos e das urinas. Era um relato comovente de dor. Até que o relato chegou ao fim, esperando, evidentemente, o aplauso, a admiração, uma palavra de acolhimento na alma da outra que, supostamente, ouvia. Mas o que a sofredora ouviu foi o seguinte: "Mas isso não é nada..." A segunda iniciou, então, uma história de sofrimentos incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira.
Parafraseio o Alberto Caeiro: "Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É preciso também que haja silêncio dentro da alma." Daí a dificuldade: a gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor. No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus. Certo estava Lichtenberg - citado por Murilo Mendes: "Há quem não ouça até que lhe cortem as orelhas." Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...
Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos, estimulado pela revolução de 64. Pastor protestante (não "evangélico"), foi trabalhar num programa educacional da Igreja Presbiteriana USA, voltado para minorias. Contou-me de sua experiência com os índios. As reuniões são estranhas. Reunidos os participantes, ninguém fala. Há um longo, longo silêncio. (Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio, como se estivessem orando. Não rezando. Reza é falatório para não ouvir. Orando. Abrindo vazios de silêncio. Expulsando todas as idéias estranhas. Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma). Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria um grande desrespeito. Pois o outro falou os seus pensamentos, pensamentos que julgava essenciais. Sendo dele, os pensamentos não são meus. São-me estranhos. Comida que é preciso digerir. Digerir leva tempo. É preciso tempo para entender o que o outro falou. Se falo logo a seguir são duas as possibilidades. Primeira: "Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você falava eu pensava nas coisas que eu iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como se você não tivesse falado." Segunda: "Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou." Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada. O longo silêncio quer dizer: "Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou." E assim vai a reunião.
Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio. Faz alguns anos passei uma semana num mosteiro na Suíça, Grand Champs. Eu e algumas outras pessoas ali estávamos para, juntos, escrever um livro. Era uma antiga fazenda. Velhas construções, não me esqueço da água no chafariz onde as pombas vinham beber. Havia uma disciplina de silêncio, não total, mas de uma fala mínima. O que me deu enorme prazer às refeições. Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa. Podia comer pensando na comida. Também para comer é preciso não ter filosofia. Não ter obrigação de falar é uma felicidade. Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro era participar da liturgia três vezes por dia: às 7 da manhã, ao meio-dia e às 6 da tarde. Estremeci de medo. Mas obedeci. O lugar sagrado era um velho celeiro, todo de madeira, teto muito alto. Escuro. Haviam aberto buracos na madeira, ali colocando vidros de várias cores. Era uma atmosfera de luz mortiça, iluminado por algumas velas sobre o altar, uma mesa simples com um ícone oriental de Cristo. Uns poucos bancos arranjados em "U" definiam um amplo espaço vazio, no centro, onde quem quisesse podia se assentar numa almofada, sobre um tapete. Cheguei alguns minutos antes da hora marcada. Era um grande silêncio. Muito frio, nuvens escuras cobriam o céu e corriam, levadas por um vento impetuoso que descia dos Alpes. A força do vento era tanta que o velho celeiro torcia e rangia, como se fosse um navio de madeira num mar agitado. O vento batia nas macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram. Estranhei. Os suíços são sempre pontuais. A liturgia não começava. E ninguém tomava providências. Todos continuavam do mesmo jeito, sem nada fazer. Ninguém que se levantasse para dizer: "Meus irmãos, vamos cantar o hino..." Cinco minutos, dez, quinze. Só depois de vinte minutos é que eu, estúpido, percebi que tudo já se iniciara vinte minutos antes. As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio. E eu comecei a me alimentar de silêncio também. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia. Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. E música, melodia que não havia e que quando ouvida nos faz chorar. A música acontece no silêncio. É preciso que todos os ruídos cessem. No silêncio, abrem-se as portas de um mundo encantado que mora em nós - como no poema de Mallarmé, A catedral submersa, que Debussy musicou. A alma é uma catedral submersa. No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos. Me veio agora a idéia de que, talvez, essa seja a essência da experiência religiosa - quando ficamos mudos, sem fala. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar. Para mim Deus é isto: a beleza que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: a beleza mora lá também. Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto... (O amor que acende a lua, pág. 65.)

terça-feira, 23 de setembro de 2008

O buraco é do Moreira ou o buraco é do Marcelo?

Em tempos de eleição, estamos todos em pavorosa e apavorados com a sede de vencer dos políticos que mais uma vez começam seus discursos com "Eu prometo...". Prometem governos fantasiosos, diga-se de passagem, clichês em essência, afinal todos querem saúde, educação, segurança e transporte não é mesmo? A diferença está no que se fala, nas expressões, ou melhor, no "falar bonito".
Não só ser um aspirante a sofista, mas também tem que ter(habilidade) uma boa aparência (aliás vocês repararam que a Jandira Feghali tirou sua franja transgressora?) e para isso temos todo um aparelho tecnológico (photoshop, prazer). O partido é o que menos importa, as coligações estão um samba do crioulo doido. Pra quem viu o Partido Comunista ser abafado na Segunda Guerra Mundial, estou chocado com o "entreguismo" do pessoal da esquerda e como o presente tá chato, vamos fugir (proutro lugar baby) para outros tempos...

Começaria com Paulo de Frontin com quem sentei longas tardes na varanda de sua casa em Serra da Raiz de Petrópolis. Engenheiro, foi ele quem junto com o Pereira Passos(O Cesar Maia da Bélle Époque) mudou a encanação e deixou tudo com a garantia dos canos Tigre. Minha patroa se deixou banhar até os dedos das mãos ficarem enrugados, ô água boa! Criou também a Avenida Niemeyer, a Delfim Moreira e alargou a Av. Atlântica. Ele está pra Niemeyer, assim como Pereira Passos está pra Cesar Maia: foram grandes construtores. Éramos bastante amigos, eu e o Frontin. Quando precisei levantar meu puxadinho pra eu passar as noites em claro escrevendo sem minha patroa reclamar, foi a Frontin que recorri e nada me cobrou. Apenas o seu voto nas eleições de 1919.

Outro prefeito que marcou a história da cidade maravilhosa foi Carlos Sampaio. Ô bicho teimoso esse cabra! Foi com ele que me pegaram em 1922 com a mão na butija, quer dizer, com o corpo todo: Tava enroscado com o comunismo até nas ventas. Mas reconheço que foi um bom político e uma de suas grandes façanhas foi acabar com o Morro do Castelo, o "pai" do Rio de Janeiro. Magnífico, bravo, só Édipo faz melhor!

Pra finalizar outro prefeito que marcou meus tempos de cabelo grisalho, foi Pereira Passos. Esse nem preciso falar muito, os livros já falam demais! Por conta do "sanitarismo" dele, levei porrada de um soldado de três metros de altura e ainda levei uma agulhada na bunda à força! Revolta da Vacina? Eu estava lá e não havia nenhum Zé Gotinha pra me salvar!


Não obstante, o Rio precisa mudar e só com a revolução nas ruas literalmente, o purgatório da beleza e do caos ficará mais mais ajambrado: http://br.youtube.com/watch?v=3FtupQxxhiY&NR=1

sábado, 13 de setembro de 2008

Error

Estava eu sentado em frente ao meu computador quando o mesmo emitiu o som de uma campainha. No entanto, era um barulho que expressava um equívoco, um erro fatal, do tipo “Não acredito que você fez isso!”. Pra piorar, as minhas parvas caixas de som (que me acompanham desde os tempos de 486) estavam ligadas no último volume me causando um estado emocional muito forte, de suar frio.

Assim, tomado de assalto, interrompido abruptamente na mecânica do abre e fecha janela, o barulho me causa nesse instante uma ruptura entre o antes e depois desse momento devastador, dessa castração sonora promovida pelo meu computador. O timbre grave gerou uma angústia que não consegui fazer mais nada, me levando ao estado parecido das vítimas que sofrem de estresse pós-traumático: Eu poderia dizer que sofro de estresse pós-barulho de erro de software.

Imagine agora analogicamente a situação trágica do sujeito. Todos os dias temos que tomar decisões que variam entre zerovírgulazerozerozeroum miligramas até as mais pesadas que nos custam uma bigorna de uma tonelada. Por mais que nossa rotina nos faça andar em círculos como os bois dos engenhos de cana (Vide Lavoura Arcaica), somos sujeitos com uma dimensão ética e que possuimos responsabilidade em nossas escolhas. O que quero dizer é que nosso destino não está dado de antemão e somos nós que sustentamos nossas idéias, pensamentos e escolhas tais para construir nossos referenciais.

O sujeito, diferentemente do computador, responde ao mundo de diversas possibilidades e nunca da mesma forma. O computador, por mais teimoso que a pessoa seja, age sempre igual e se for o caso de exigirmos alguma tarefa que ele não possa cumprir, pronto, o estrondo do equívoco aparece. Já o indivíduo não: Para cada ato, age de uma forma bem específica e ao mesmo de modo que não seja totalmente pensado, calculado e que possa ser previsível como no caso da engenhoca cibernética.

Essa especificidade nos é conferida pela linguagem. Essa não é apenas um meio pra se falar das coisas, mas ela constitui um mundo e mais, um imundo. Ela nos condena a nos dizer certas palavras, às vezes com duplo sentido, de forma incompleta. Para Ronald Barthes, a língua é fascista, isto é, na medida que nos obriga a dizer certas coisas.

O “error” angustiante que o computador apresenta é um tapa na cara em nós que toda hora agimos de modo impreciso e mesquinho, sendo atravessado por inúmeros significados que a cultura nos dá. A impressão que dá quando ouço esse barulho aterrorizante é a mesma quando estou no ônibus e de repente ouve-se um tiro. Instalado o pânico na hora. Um baque que nos reduz a baratas tontas procurando o melhor lugar pra se esconder do baygon que no nosso exemplo é a bala perdida.

Mas veja você, alguma coisa se diz e depois de ser dito vê a posição do sujeito implicada no que ele disse. É assim, nós vamos fiando palavras que engendram discursos nas malhas da coesão e com as cores da coerência. No dia-a-dia, às vezes nos sentimos totalmente alheios a nós mesmos, quando por exemplo, num enterro ao invés de falarmos “meus pêsames” à viúva, falamos “meus parabéns”. Mas o que isso quer dizer? Será que foi um descuido sem culpa? O que eu tenho a ver com o que eu falei? O que eu disse?

A experiência nos mostra que a linguagem nos dá um certo basta e por mais que não sejamos culpados, somos responsáveis - isto é, não tem uma intenção, mas fui eu quem falou. O psicótico tira esse automatismo da linguagem: Se falarmos um ponto e que consensualmente é um ponto de ônibus, ele pode teimar em dizer ser o ponto de uma puta ou então gastar litros de “água mole” jogando em pedra dura esperando que essa fure.

Portanto, dizemos tal coisa pra não dizer outra e é por isso que não somos “Pentiuns”, “Macintoshs”, pois a cada descuido nosso (desculpe a redundância) nos descuidamos diferentemente. Mas uma coisa é certa: A afetação que isso nos causa pode ser tão potente quanto a do barulho devastador quando clicamos algo indevido e assim erramos.

sábado, 2 de agosto de 2008

Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres

"Mas olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não se entende porque não queremos passar por tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos um ao outro. Não temos nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos. Temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo...Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de ódio, de amor de ciúme e de tantos outros contraditórios."

do livro "Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres" de Clarice Lispector.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Acabando com o chororô.

Caros leitores,

Estive passeando na Argélia Comunista por alguns dias e cá estou de volta para o mesmo cantinho humilde virtual. Pude constatar que meu interino fez um bom trabalho, ainda que tenha ficado um pouco esquizofrênico o texto sobre a raridade que é encontrar pessoas chorando no asfalto. Vá lá, primeira vez que o deixo escrever por conta própria. Gostei do que ele fez com as imagens e adorei a Suzana Vieira chorando pelo flagrante do seu marido com a garota de programa no motel.

Como foram de férias? Ou se ainda estão, como estão indo? As minhas foram ótimas e bastam poucas linhas para descrevê-la. Como era de se esperar, levei minha família (mulher e dois filhos) mais o meu fiel escudeiro Franklin Frankenstein, mais conhecido como o cérebro de Bernard Shaw, mas isso é passado. Agora ele já sabe falar português e em breve fará parte dos redatores desse blog enquanto estarei impossibilitado do exercício da escrita. Todos que escrevem nesse blog são funcionários públicos, então não me venham com exigências propícias a um AVC: Façamos o nosso trabalho humildemente, de boa qualidade e na hora certa e no momento certo.

Deparei-me com tanta burocracia na volta das férias que peguei alergia à papelada, estou com coriza e não posso tomar sopa que meu nariz derrete. Sabe-se que as eleições para prefeito estão chegando e este evento não posso perder de nenhuma maneira. Então, a partir do próximo post falarei um pouquinho sobre as eleições passadas e esticadas de outrora. É isso, não mais. Chega de promessas e até o próximo post.



ps: Pra quem ficou com saudades do meu interino, ele possui um blog também.

domingo, 13 de julho de 2008

Faltam lágrimas nas ruas.

As fotos e o título no post passado, tudo pra mostrar como é estranho chorar e ver alguém chorando em público e como cada vez mais fica mais esquisito nem que seja soluçar ligeiramente.É raro ver alguém chorando na calçada, no trânsito, na padaria e até mesmo no point dos bebuns,o bar. Faltam lágrimas nas ruas. Não obstante, quando alguém chora é objeto de atenção, as pessoas param pra ver a miséria do outro. A multidão que passava com toda sua determinação, diminui o passo e encara a cara infeliz de quem está chorando. Enfim, chorar em público tornou-se uma performance. Todos querem saber o que aconteceu, qual o motivo da tristeza e até mesmo alguns saem do anonimato da multidão para se aproximar do infeliz e tentar ajudá-lo. "Quer um copo d´água?", "Você não pode ficar assim...", "Olha, aconteceu coisa parecida comigo, deixa eu te...".

Chorar em público traz à baila a questão da fraqueza. Pare de chorar. "Você é um homem ou um rato?" O homem aqui tomado como geral, pode ser homem como pode ser mulher. Chorar pertence à nossa intimidade, o ato de chorar sempre foi considerado como algo particular que constrange o outro e por isso deve ser velado, escondido ou exorcizado em um quarto escuro. Ninguém pode saber. Então se eu choro e o outro vê, me sinto fraco porque estou trazendo algo da minha interioridade, do meu "Eu" verdadeiro que falha, uma falha no sistema.

Assim, chorar em público tem ficado cada vez mais difícil e quando isso acontece parece o quinto ato de rigoletto, uma tragédia grega. Não é à toa que os jornais vendem diariamente manchetes trazendo rostos super expressivos se debulhando em lágrimas. Chorar virou algo de espetacular, mas não foi da noite pro dia porque ...assim... não estamos mais acostumados com "a passagem ao ato" do outro, isto é, expressar dor, ódio, tristeza não combina com a sociedade atravessada pelo "american way of smile".

quarta-feira, 2 de julho de 2008

Um choro na multidão




















*obs: O Barão de Itararé está de férias. Leonardo Velasco escreve como interino.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Afasia

Numa bela noite clara, me deparei com a espiritualidade. Abro a porta do meu quarto, acendo a luz e um cigarro também pode ser. Nunca havia parado pra pensar nos espíritos, nessas coisas do além,sempre as achei cabalísticas no sentido mais etéreo que isso possa ter. Desde que encontrei Déscartes traço tudo num plano cartesiano e esqueço do resto. Só quero saber se matematicamente é viável e ponto. Somo e divido por dois. Não tenho paciência para religião: a única que aceitei foi o marxismo, mas logo que fundaram o PCB em 1922 pulei fora e adotei o famoso "Tenho espiritualidade independente de religião". Tenho sim, sou um católico impraticável assim como um esquerdista-liberal.
Eis a verdade, minha vida espiritual é um paradoxo. Até que num momento de total catarse (sem propósito, em plena segunda-feira) me entreguei a religião. Fui tocado por um sentimento diferente, parece que desligaram todas as minhas tomadas e assim, deixei de ter razão. Aliás, pra que ter razão sobre tudo? A razão foi inventada para alguns dizerem pouco pra muitos ouvirem. É de um plano de cima pra baixo, colocando todos ao pé da Grande Razão. Contata-se, não obstante, que os seres humanos(e eu odeio usar essa palavra) são pequenos e que muitas coisinhas acontecem e há de se teimar em reduzi-las em fictício, em sugestão, ilusão. São as historietas que aparecem aqui ou acolá, no jornaleiro, na fila do banco, nos fragmentos do cotidiano. São, na verdade, coisas fora da razão que nos fazem viver. Com razão, não há vida.
Por mais absurdo que isso pode parecer às vistas de um intelectual em formação que toma as palavras à ponta de faca ou então, como peças sólidas de um castelo imagético que possa dar conta das convicções, a razão é pouca.

E por não ter razão nenhuma, eu escrevi esse texto.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Os incompreendidos


Mais uma vez volto com a resenha de um filme que ganhei de aniversário de uma pessoa muito amiga minha. Se chama "Os incompreendidos" do diretor François Truffaut que ficou imortal pela sua contribuição ao cinema com a chamada nouvelle vague.
A priori, não estou interessado em uma apresentação do movimento na história do cinema e suas implicações, mas principalmente pelo que o filme chama mais atenção a ponto de ser descrito aqui no PSEUDEANDO.

É uma história verídica baseada na infância do próprio Truffaut que senão fosse o André Bazin, poderia ter seguido outro caminho como o próprio mostrado no filme, o da marginalidade. Trata-se do jovem Antoine Doinel, interpretado pelo Jean-Pierre Léaud, que "tem uma espécie de solene desapego, como se o seu coração estivesse marcado por profundas feridas adquiridas muito antes que o filme fosse rodado." Antoine mora com a mãe e o padrasto. Aquela é uma mulher nervosa, possui um amante, se angustiada com as condições de vida e com o próprio filho que ela faz questão de anulá-lo como sujeito, psicanaliticamente falando.O padrasto seria então o responsável pelo elo familiar e o que dá reconhecimento ao menino.

Antoine é um aluno indisciplinado, sujeito das pequenas infrações na escola como a de uma cena em que a foto de uma mulher nua passava de mão em mão até chegar na de Antoine quando então o professor o surpreende e o castiga. A partir daí, Antoine só aumenta sua indisciplina, falta a escola e quando perguntado o motivo de sua ausência, ele alega que a mãe morreu.

A mentira é sustentada até o momento em que a mãe aparece furiosa no colégio. Mas ao contrário do que seria previsto, a mãe não o castiga e o padrasto propõe uma saída com a família para o cinema. Parece ser um dos momentos mais felizes do filme que é marcado por um sofrimento atroz.

Antoine que é um garoto de doze anos, tem que lidar com situações que não estão dadas de antemão para um adolescente de sua idade. É nesse enredo fantástico de Truffaut que mostra a condição trágica do sujeito. É aí que o sujeito deve advir. A escola ortodoxa representada por um professor severo e às vezes sádico mostra o contexto da educação na época. Antoine se viu numa situação que ele fora obrigado sem ter mesmo pedido, embora tivesse o ingresso na mão. Ele teve que ser criado por uma mãe negligenciadora, por um padrasto que não é o pai dele, teve que ir pra escola todos os dias e teve que se expôr à arbitrariedade de um professor. Enfim, isso nos mostra como o nosso psiquismo é atravessado por um Real bruto.

O destino de Antoine como marginal ou como cineasta, este último como foi o caso de Truffaut, não está dado de antemão. É o próprio menino que irá sustentar essa responsabilidade pelos seus atos, idéias e construir pra si seus próprios referenciais. Antoine poderia ter sido, por analogia, as histéricas do século XIX que Freud as escutava sem ter uma fórmula ideal para curá-las. Assim como as histéricas, Antoine está num contexto social falido.
Freud ouve aquelas mulheres sabendo que este contexto social não dizia quem elas eram. Isso vai evocar a idéia do que é o corpo, a sexualidade, o que é ser mulher, o que é ser homem.
Pelas histéricas, constata-se que o corpo não nos pertence. Este pode adoecer, diz pro outro sobre a nossa idade, nossa origem. Um irreversível que a gente não domina. As histéricas estavam em um contexto que não ainda não havia movimento de libertação feminina.

Assim é o caso do pequeno Antoine que o professor nem quer saber da sua origem, das suas virtudes e do conflito que o jovem passa. Porém, a dimensão do sujeito está em tudo, como observou Freud, não está somente na esfera privada. O sujeito aparece com o sintoma. Os modos de subjetivação que indicam como se comportar, como ser um aluno, como ser um passageiro de ônibus não excluem o sujeito. Há uma lei que o sujeito precisa respeitar, mas ainda assim precisa se responsabilizar. Assim, Antoine advém onde ele deveria advir? Antoine advém como sintoma, istoé, como um rebelde, uma voz solitária na massa, como as histéricas que paralisavam o braço, a perna. O filme termina com o zoom da imagem congelada do jovem, olhando diretamente pra câmera. Ele acabou de fugir da prisão e está na praia, aprisionado entre a terra e a água, entre o passado e o futuro. É a primeira vez que vê o mar.


Contribuíram para a resenha:
Roger Ebert - "Os incompreendidos" in "A Magia do Cinema".
Aulas muito boas de psicanálise em 2008/1 da Fernanda Costa-Moura. ;)

sábado, 3 de maio de 2008

quinta-feira, 1 de maio de 2008

EU gosto, EU quero, EU faço.

Não sei se já falei disso em algum blog meu, mas não importa, falarei mesmo assim...

É incrível como cada vez mais vivemos numa política de salve-se quem puder. É claro que eu não nasci ontem e sei que o individualismo é o alicerce do nosso contexto atual. Porém, nunca se ouviu coisas como "ele é assim porque quer" ou "cada um faz o que gosta" impera como os grandes eufemismos da nossa época que mostra como nos tornamos cada vez mais únicos, mais sujeitos em si e para si mesmos.

Nos anos 20, no auge da Revolução Russa, surge a possibilidade de ser diferente. Surgiram as vanguardas européias na literatura, nas artes plásticas e no cinema. O homem-câmera do Vertov era expressão de uma esperança de abrirmos mão de nossa individualidade assim como os heróis coletivos do cinema do Einsenstein. Chega de close-ups, o lance é agir independente de uma subjetividade que esta sim é burguesa e perfídia do sistema. Surge ao mesmo tempo a Sociedade do Espetáculo onde as imagens correm soltas, a espécie homo videns e todas as outras características estéticas específicas do contexto.

O fim como nós todos já sabemos é trágico. A televisão e os outros meios de comunicação introjetam figuras menos autoritárias e mais sedutoras que os pais, a escola e outros que eram exclusivamente delegados a produzir subjetividades. Substituindo assim o papel das instituições modernas, os meios de comunicação criam modos de entender o mundo, modos de ser. Dessa forma, o EU é o privilegiado. O eu consciente, é claro. O insconciente ainda possui uma certa relevância no contexto atual, embora sua primazia tenha sido deixada para a velha modernidade.

(O homem da câmera - Dziga Vertov 1929)

O meio é propício para os gostos conscienciais, os atos e aquilo que é mais aparentável de ser. Assim, o gosto é o determinante de uma essência, se é que podemos falar de uma essência, mas são as preferências, hoje em dia, que singulariza o sujeito e muito além disso, o isola. Cada um toma os próprios gostos pra si e que se dane o outro. Aliás é o outro que está excluído da minha escolha. "EU gosto de ouvir tais bandas", "EU detesto determinadas situações", ... é o eu sozinho que faz suas escolhas e se encerra em si,não admite alguma forma de intervenção. A identificação é rápida e flexível, variando num ritmo frenético. A fila anda. Stuart Hall fala do supermercado cultural, istoé, das coisas que circulam mundialmente e colhemos para fazer parte daquilo que chamamos de identidade, que é menos uma bola de bilhar do que um mosaico multicolorido.

Com o neoliberalismo e seus efeitos, como o desemprego e menos estabilidade das relações contratuais, o que está em jogo é o salve-se quem puder, ou modernizando o ditado, salve-se quem puder e quiser. Hoje em dia, por mais reacionário que isso pareça, o pobre é assim porque quer, porque gosta da sua condição e não por explicações causais maiores como porque ele não teve oportunidades ou porque ele foi duro com a vida. A pobreza é considerada como uma escolha.

A enorme variedade de possibilidades e a suposta liberdade que a cidade permite ser nos caracteriza como os únicos que poderão dar o ponto final nesse mundo dadaísta que vivemos. Somos senhores do nosso destino, queremos espantar nossa característica trágica e por isso tudo aquilo que nos caracteriza, o culpado é o EU, o mesmo que faz os gostos, é o réu da sua própria sina. Por isso ainda, tanto charme e elouqüência na mídia, para afastar o que há de trágico em nós, o que não tem sentido, o que não há explicação. Tornemo-nos neuróticos sim, mas mais ainda por tentarmos sermos ao máximo aquilo que queremos e senão o atingirmos, fracassamos e assumimos culpa desse fracasso. Sou EU que gosto, sou EU que quero e sou EU que faço.

segunda-feira, 3 de março de 2008

MA FRANÇAIS EST TRÉS BIZARRE



http://www.youtube.com/watch?v=bybKftoefsw

Para vocês como eu que não tem tempo ($$$$$$$$) não aprendem francês, eu lhe dou a solução: YELLE em três lições!
1.SEJA VINTAGE: VISTA-SE COMO SE TIVESSE NOS ANOS 80, se ainda tiver Pega Vareta, Pogobol ou Atari melhor ainda.
2. Abuse no Pop! Seja Pop e não tenha vergonha disso! Quando seus amigos lhe olharem estranho, pense senão está na hora de parar.
3.Freqüente festas fashionistas em que você pode aparecer no Marcelo Araripe ou na Erika Palomino.
PRONTO! VOCÊ É TÃO FRANCÊS QUANTO YELLE! \o/



Meu amigo Frankenstein acordou hoje com ressaca moral da noite passada. Afinal, um cérebro prestigiado como de Shaw deve ter abusado muito do seu córtex cingulado anterior, a área que é responsável pela coordenação dos movimentos e ações e nos diz a respeito se o que estamos fazendo está de acordo com aquilo que queríamos fazer. Bêbados na maioria das vezes efetivamente mandam o cingulado anterior pro espaço, como fez meu querido frank Shaw.

"Oh man, I've got a terrible headache!"

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A saga do Frank ...(ic)... Frankenstein.

Anos e anos lecionando na faculdade de Cambridge, dando palestras pelo mundo afora e escrevendo os títulos dos melhores best-sellers, nunca imaginei vivenciar esse momento de extrema importância e que deixará marcas até eu virar cinzas. Uma coisa gosmenta, acizentada com algumas regiões brancas, com a forma achatada e se encontra em dobras. É... eu achei o cérebro!

Eram altas horas da noite quando ouvi um barulho no andar de baixo, mais exatamente, no sótão onde fica minha adega com os melhores vinhos do Brasil e talvez do mundo. Curioso e destemido como eu não existe, então parti para saber o que estava acontecendo. Coloquei meu roupão de seda, minhas pantufas pois se eu saísse da minha quente e colocasse meus pés no chão frio seria motivo de mau humor para o dia inteiro. Durante o caminho pensei no que poderia ser essa hipótese: Será que é o meu filho que decidiu bebericar um Romanée-Conti ou Château Latour? Não, ele é adepto da Cantina da Serra mesmo.

Fiquei mais impressionado com o ritmo a cada passo mais próximo, parecia uma escola de samba. Será que estão fazendo uma festa surpresa pra mim e chamaram a bateria da Mangueira pra comemorar? Mas meu aniversário já passou e os meus amigos mais próximos sabem que de samba eu só gosto de Cartola, meu amigo de infância.

Quando cheguei então na porta, o barulho parou. Resolvi abrir... A porta estava entreaberta e lá se encontrava o meu maior segredo com vida! O meu Frankenstein!
Anos e mais anos de pesquisa tentando encontrar um segredo, qualquer que fosse, para animar a minha experiência mais extravagante de toda minha vida. Eu já havia até esquecido dela.

Mas... como ele conseguiu vida?

Eu fui conversar com ele, afinal, ele possuía o cérebro de Bernard Shaw e com certeza saberia se expressar da melhor forma possível. Porém, notei que alguns meus "Sauvignons" estavam abertos e to-tal-men-te vazios. Então percebi que meu querido recém-nascido tinha um forte pra bebida.

"-Oh man, I lost count of how much I have drunk!Could you take me home?"

Não tinha escolha senão concordar e levantar Bernard Shaw no corpo de um homem de mais de 90 quilos e carregar até o quarto de hóspedes. Assim que chegamos, ele se jogou na cama e apagou.
A partir daí eu sei que o seu sistema modulador estava ativo desativando seu locus coeruleus que assim diminuia a quantidade de adrenalina no cérebro de Shaw o embalando para uma noite tranquila.

Eu apaguei a luz do quarto e disse em voz baixinha: "Good night, Bernard." E fui dormir.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Quando nasci,o mundo das idéias disse: Desce e pseudeia!

E aí seu ano novo foi assim... como o da Hebe?

Aposto que fizeram muitas listas, promessas, projetos e dúvidas se tudo isso vale a pena. Não chorem ainda não porque tenho uma canção ou melhor um funk!
Pra começar 2008 com pé direito vou contar a história da subjetividade, tão pseudeada aqui neste blog. E como não poderia ser, vamos pseudear mais e mais porque esse ano não é só mais um ano, mas sim o ducentenário da vinda da família real ao Brasil.(E o kiko?)
Assim, a subjetividade dessa época também será privilegiada assim como a nossa época, a pós-modernidade que é rica em questões de extrema relevância para a sociedade. Então terminaremos a genealogia da subjetividade digna de Foucault com o momento pós-moderno com a participação de Deize Tigrona. Além disso, teremos participações especiais da Menina Pastora, Jerry Springer e outros que trabalham com afinco na produção de subjetividades.

Curiosos? Então que comece a pseudear subjetividades!

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A HISTÓRIA DA SUBJETIVIDADE: DA GRÉCIA A DEIZE TIGRONA

Já dizia Platão e a torcida grega do flamengo que nós não somos coisa alguma. Somos menos alguma coisa que alguma coisa está em mim e esse sou eu. Na verdade, é mais um ele que sou eu, pois somos nada mais nada menos uma alma que não é minha, individual, mas sim uma alma universal que circulava no mundo das idéias antes de eu nascer.
Não havia subjetividade interiorizada com experiências ancorada em um "eu".Nem um eu que mantem cuidados de si para si mesmo, é um eu que visa automedida, autocontrole que precisa se conhecer para domar seus vícios para então salvar sua pólis das garras de um tirano, é um eu para pólis. O sujeito grego tinha então uma espécie de subjetividade power ranger em que seu dever principal era ser um Megazord com toda sua força maximizada para eliminar a tirania da Rita Acapulco e sua turma.


Aí veio a tópica do cristianismo, que vigora até hoje só que de uma forma bem diferente. O homem santo se destacava da sua comunidade para encontrar os pensamentos infundidos por Deus. Assim, sua subjetividade se torna recatada, jogada para segundo plano que serveria de espaço privado que só seria aberto nas confissões do século XVI quando a Igreja foi a primeira a colocar os nossos desejos íntimos em um discurso. Pra você ver que essa história de contar intimidades para um estranho num espaço íntimo não é tão original assim...

Se o padre foi o precursor do psicanalista, consideramos que seu divã era arcaico, já que o indivíduo mal conseguia se ajoelhar naquela casinha de madeira comida por cupim. Os psicanalistas sacaram a idéia e compraram um divã bem acolchoado, reclinável e com almofadas caso no meio da sessão, quiser dormir para então acordar e contar o sonho que teve ao analista. Ainda conseguem uma boa grana com isso, já que ouvir o que você sonhou na noite passada ou o que desejou custa muito caro.


A Menina Pastora,atualmente uma das líderes mirins em subjetivação em massa pela religião , possui um poder que, salvo Xuxa, consegue dominar massas com seu olhar angelical e a voz doce impelindo o povo para um Deus que no vídeo ela diz suas qualidades num modo quase hipnótico.
http://www.youtube.com/watch?v=5_ep3ZqAi8I

Muitas pessoas preferem outros meios de produção de subjetividade como a TV. A TV dá formas de entender o mundo, de como se vestir e até mesmo de como representar na vida real como por exemplo, chorar de um lado só quando está triste e aprender que todos nós temos duas caras, mesmo que exija muitas páginas da vida pra descobrir isso.

Jerry Springer, um apresentador da TV americana, que apresenta um programa que exibe conflitos pessoais regados a porradaria declarou uma vez fazer o certo, porque senão estaria errado. Ele quis dizer que seu programa é de grande audiência e assim é incontável o número de subjetividades que ele subjetiva. Muitas estratégias como o zoom nos corpos, especularização do conflito e até mesmo um fogo na lenha. É como se a vida fosse reduzida a conflitos que precisam se expôr, porque o que não acontece na TV muitas vezes não acontece. ( http://www.youtube.com/watch?v=aQej27tSpY0 )

A internet, mais especificamente, o orkut e o fotolog permitem meios de exposição que produzem outras formas de subjetividade. O sujeito não precisa se esconder do olhar público para ser mais autêntico, a fronteira entre o ser e o aparecer está diminuída e legitimamos subjetividade até mesmo nos textos bobos e nas fotos que postamos nos sites pessoais. O olhar público se estende cada vez mais para nossa intimidade, vide exemplo da foto abaixo.

(O Olho que tudo vê e nada vê.Seria o panóptico de Bertham? Hm aprecie o abstrato.)











Assim pseudeando subjetividades, arriscamos a idéia de que assim como a religião, a psicanálise, os meios de comunicação, o funk de Deise Tigrona é um meio de subjetivação.

No ano passado dei uma palestra exclusivamente sobre o assunto, não me vem a cabeça sobre exatamente o que era, mas é claro, lembro do título que eu mesmo fiz: "Deise Tigrona a alma: Subjetivação até o chão!"

Segue o resumo sobre a apresentação publicada no site de um congresso internacional de muita consideração:

"DEISE TIGRONA DO QUADRIL À ALMA: SUBJETIVAÇÃO ATÉ O CHÃO!"

Neste trabalho pretendo expôr a hipótese de que a nossa sociedade pós-moderna, os meios de subjetivação estão cada vez mais diversos e que a música, poderoso mobilizador de corpos, partindo da famosa frase de Foucault "Pelo corpo, atingimos a alma" atinge a alma quando instiga o rebolador com versos perniciosos como "está ardendo mas está entrando" ou "Injeção dói quando fura / Arranha quando entra / Doutor assim não dá / Minha poupança não agüenta". Essa pesquisa patrocinada pela CNPq e a FAPERJ tem como objetivo investigar as formas de subjetivação que os funks de Deise Tigrona realiza ao mobilizar os quadris dos indivíduos e através deles atingir a alma.


Esse pequeno resumo ilustra minha curiosidade pela cantora que mobiliza multidões, passando da erotização a autoerotização, do próprio cuidado com o remelexo, com a interiorização da rebolada.

É isso minha gente, até o próximo post do ano que contará com a presença de Fafá de Belém e a visibilidade!